sábado, 7 de setembro de 2013

Porque a morte, resfriando-nos o rosto/Consome a minha concepção vesânica/ E a alfândega onde toda a vida orgânica/ Há de pagar um dia o último imposto”.
É quando percorremos o conjunto da obra de Augusto dos Anjos que nos livramos daquela imagem-chavão de um poeta esquisito, useiro e vezeiro de uma linguagem esdrúxula, meio kitsch, tomada do vocabulário científico. A imagem que surge é outra: um poeta extremamente consciente (a perfeição do verso em Augusto dos Anjos e, em especial, a sua aplicação no soneto, são impressionantes) e um volume que está para o Brasil como As flores do mal para a França (em ambos, a mesma influência-matriz: Edgar Allan Poe). E estamos falando de um poeta que morreu aos 30 anos (Baudelaire morreu aos 46).
Outro grande sonetista, Antero de Quental (1842-1891), escreveu O palácio da Ventura:
Sonho que sou um cavaleiro andante/Por deserto, por sóis, por noite escura/Paladino do amor, busco anelante/ O palácio encantado da Ventura//
Mas já desmaio, exausto e vacilante/ Quebrada a espada já, rota a armadura…/E eis que, súbito, o avisto, fulgurante/ Na sua pompa e aérea formosura//
Com grandes golpes bato à porta e brado:/Eu sou o Vagabundo, o Deserdado…/Abri-vos, portas de ouro, ante meus ais!//
Abrem-se as portas d´ouro, com fragor…/Mas dentro encontro só, cheio de dor/ Silêncio e escuridão—e nada mais!”